quarta-feira, 9 de maio de 2012

Capítulo 4: Confrontando Demônios

Evanescence - My last breath

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Eu sei que você me ouve
Eu posso provar isso nas suas lágrimas

Segurando meu último suspiro
A salvo dentro de mim
Estão todos os meus pensamentos sobre você
Doce luz extasiada
Isso termina aqui esta noite

Fechando seus olhos para desaparecer
Você reza para que seus sonhos deixem você aqui
Mas você ainda está acordado e sabe a verdade
Ninguém está lá
(Evanescence - My last breath) 


Quando entramos na mansão Isabella estava em pé no salão de entrada, ela estava exatamente igual, do jeito que eu me lembrava, rosto jovem, cabelos longos negros como a noite, seus olhos verdes mais penetrantes do nunca, ela não tinha mudado em nada.
E agora quase dois anos depois, nossa semelhança ficava cada vez mais visível.
- Oi Isabella - eu me aproximei e abracei, nossa como era bom estar em seus braços de novo, estando aqui agora, eu me questiono como aguentei ficar tanto tempo longe dela, eu acho que é por isso que eu sentia um peso o tempo inteiro enquanto estive longe.
- Minha filha, eu não aguentava mais ficar sem te ver, nunca mais suma desse jeito entendeu? Eu não vou deixar. - ela me abraçou apertado e ficamos assim por longos segundos - Hã, você deve estar cansada não é mesmo? E você Clara meu amor, como está?
- Eu estou bem Isabella, com saudades de vocês é claro. - Clara deu um meio sorriso, mas eu percebi o quanto ela estava exausta.
- É eu estou um pouco cansada sim, não consegui dormir direito na viagem. - menti. Quer dizer, não era uma mentira total, eu consegui dormir direito na viagem, mas eu me sentia como se não dormisse a uns dois dias, todo o bom humor, e o bem estar já estavam se esgotando e eu os podia sentir sendo sugados de mim, e a Clara também precisava de um descanso.
- Oh, é claro, me deixe levá-las pro quarto.
Enquanto subíamos a escada ela continuou:
- Ele fica no mesmo lugar sabia? Está exatamente como vocês deixaram - ela sorriu, seus olhos verdes brilhavam como um campo de flores silvestres.
- Obrigada Mãe. - "Mãe", há muito tempo eu não chamava Isabella assim, foi tão espontâneo que quando me dei conta já tinha dito, acho que era a saudade, e toda a carência pela falta dela, o motivo ao certo não importa, porque assim que eu disse isso, ela ficou me olhando até chegarmos ao quarto, e pude perceber duas lágrimas de sangue no canto de seus olhos, que ela limpou rapidamente.
- Prontinho, o quarto de vocês, se estiver faltando alguma coisa é só falarem comigo que eu providencio, agora tomem um banho e descansem que eu vou preparar alguma coisa pra vocês, mas não fiquem muito esperançosas, tem quase dois anos que eu não cozinho mais - ela riu e saiu pela porta junto com a Hevi.
 Depois disso eu comecei a desfazer as malhas, e de rabo de olho eu pude ver que a Clara me encarava, eu me virei.
- O que foi? - eu me sentei na cama.
- Nada - ela sorriu - Nadinha mesmo.
- Ah menos Clara, fala logo o que deu em você?
- Nada, eu quero saber o que deu em você, pra de repente esse sorriso tomar conta do seu rosto? - nós ficamos nos olhando por alguns segundos em silencio. Eu não sabia o que dizer, eu nem sabia que estava sorrindo. - Ah tanto tempo eu não via esse sorriso em você, se eu tinha alguma duvida quanto essa viagem, todas elas morreram agora. Você pode não admitir Cat, mas nós duas sabemos que você tem sido infeliz todo esse tempo. Partir daqui de certo modo foi um erro, mas isso não importa, nós vamos consertá-los e você vai ficar bem - ela sorriu pra mim.
Eu abaixei a cabeça. Não nós não vamos consertá-lo, e eu sabia disso.
- Não, não foi um erro. Era o que tinha que ser feito e eu fiz, e eu não fui infeliz todo esse tempo, ao contrário eu estava tão feliz quanto, então vamos mudar de assunto ok? Eu estou aqui não estou? Então pronto.
Eu me levantei e fui tomar um banho, mas antes que eu saísse do quarto pude ouvir o risinho da Clara atrás de mim, o mesmo risinho que ela dava quando sabia que eu estava sendo teimosa, não pude evitar sorrir também.
Quando sai do banho, Hevi e Clara estavam sentadas na cama conversando sobre alguma coisa relacionada a uma tradição, eu não me enterrei muito do assunto porque ainda estava cansada. Quando terminei de me arrumar e escovar os cabelos, fui procurar saber qual a programação de hoje.
- Então Hevi, qual a programação de hoje?
- Hum.. Me deixe pensar, Henrique está muito ansioso pra vê-la, ele disfarça, mas não teve um único dia em que ele não tenha falado de você e seu tio Joseph está quase invadindo o seu quarto, quando você foi embora sem se despedir ele ficou totalmente frustrado, claro que você não pode fazer nada afinal ele não estava aqui na ordem, ele quis ir até você, mas Henrique o convenceu de que seria melhor não, que você não.. Enfim, agora sabendo de sua chegada, ele disse que deve ir vê-lo imediatamente.
- Eu não entendi.. Henrique o convenceu que seria melhor não, porque eu...? Por que eu o que Hevi? - ergui as sobrancelhas.
- Hum.. Desculpa Cat, mas é porque ele disse que você não iria gostar e que você não queria qualquer aproximação perto de sua irmã, então ele não foi.
- Ele.. Ele deve ter entendido mal, quer dizer.. Deus ele deve estar magoado, não foi isso, eu não quis dizer que não queria vê-lo, é que.. Tente entender Hevi minha irmã é uma criança, e eu não a quero envolvida nesses assuntos, mas quanto a Joseph eu o amo, ele é meu tio.. Ele está muito magoado? - fiz uma careta. Ele era a última pessoa que eu iria querer magoar.
- Claro que não, não se preocupe com isso Cat, de verdade. Ele entendeu perfeitamente.
Eu tentei sorrir, mas não me sai muito bem.
- Cat é sério, não se preocupe com isso. Aliás, pra lhe provar isso, porque não vamos até ele agora? Está quase anoitecendo, então é melhor irmos logo se não só o encontraremos amanhã.
- Claro, vamos sim.. Você vem Clara?
- Não eu vou tomar meu banho, e depois a Hevi vai fazer alguma coisa no meu cabelo, que eu ainda não entendi direito, ela disse alguma coisa em Italiano, e a única coisa que eu entendo a esse respeito, são os homens então.. Enfim, podem ir, e você Hevi quero que use essa velocidade pra algo urgente, eu.você.meu cabelo. Agora vão!
- Começo a pensar que temos que compartilhar esse conhecimento, homens + italianos, não sei por que tem algo que me atrai nessa junção.. Deve ser por causa do Fernando, mas isso é uma história pra outra hora.
- Ok, agora vamos pular a parte de históricos amorosos, e eu posso, por favor, ir ver o meu tio?  - Nós rimos.
- Claro, vamos Cat.. Eu já volto Clara, e não passe condicionador, depois eu explico por que.
- Vamos.

Foi uma caminhada rápida até o jardim que ficava na parte de trás da mansão, pelo menos foi o que pareceu já que durante todo o percurso nós ficamos rindo e dizendo coisas sem sentido uma pra outra. Mas só a remota ideia de que Joseph pudesse estar ofendido, ou magoado por minha causa, fazia meu estômago se revirar.
Eu parti, porque tive que parti, mas isso não significa que eu não os ame, ao contrário, eu os amo tanto, mais tanto que todo esse tempo... Eu não admitia, mas depois que eu os deixei, eu deixei também toda e qualquer paz aqui.
E em pensar que Joseph pudesse achar o contrário disso, me fazia querer andar ainda mais rápido.
Mas logo chegamos, no jardim uma brisa fresca soprava meu rosto, e a frente pude ver Joseph de costas, ele encarava o campo, perdido em pensamentos, e só se deu conta de nossa presença quando a Hevi rompeu o silencio.
- Joseph, senhor?
Joseph se virou e a Hevi fez uma pequena saudação.
- Ou, obrigada Hevi. – Ele se aproximou, e durante todo esse tempo seus olhos não deixaram os meus. – Hm.. Pode ver se os guerreiros já chegaram do serviço Hevi? Estou esperando pelo relatório deles.
- Claro, então está entregue Cat, mais tarde nos falamos.
Um sopro e a Hevi se foi, mas agora... Mesmo tendo estado todo esse tempo longe, eu não me assustei, nem estranhei, era... Normal, comum, agradável, diria até... Familiar. Eu sorri.
- Então minha sobrinha, esse sorriso em seu rosto devo imaginar que é por me ver? – ele riu.
- Tio – eu corri e o abracei.
Eu tinha sentido tanta a falta dele todo esse tempo, sempre com um conselho, um sorriso, um abraço acolhedor, se eu pudesse definir a paz e a tranquilidade, as chamaria por seu nome.
- Oh minha querida, eu senti tanto a sua falta. – ele retribui o abraço e ficamos assim por algum tempo, até que me afastei para poder olhá-lo.
- Me desculpe por não ter me despedido, mas as coisas ficaram... Complicadas eu acho, hã... Não pense que eu não queria te ver, quando eu disse que não queria contato eu... Deus! Me desculpe tio é só, minha irmã é uma criança, e não suportaria vê-la no meio de toda essa guerra.
- Eu te entendo, não se preocupe, sei o que sente por nós minha querida, e em momento nenhum eu duvidei disso, mas me fale de você, como está?
Eu me afastei um pouco, e desviei os olhos, essa pergunta vinda de outra pessoa poderia ser facilmente respondida com “estou bem, não se preocupe”, mas quando se tratava de Joseph, que em alguns momentos cheguei a suspeitar que conseguia ler minha alma, eu não poderia dar como resposta uma frase pronta.
- Eu estou...Respirando, e isso é tudo o que importa. – Eu sorri.
Joseph me encarou por longos minutos antes de dizer alguma coisa.
- Catarina – Ele pronunciou o meu nome lentamente, em sua voz eu podia perceber um resquício da dor – Minha sobrinha não faça isso a si mesma, não haja dessa forma.
- Fazer o que? – Arqueei as sobrancelhas.
- Você sabe do que estou falando Catarina, não use a máscara de frieza comigo, sabe que eu lhe conheço melhor do que isso e com o dom que possuo, te conheço melhor até do que você mesma, e tudo o que sinto é... Raiva, frieza, medo, e dor. Não é pra ser assim!
- Você está enganado, eu estou bem.
- Não minta Catarina, você pode ser boa em fingir isso para os outros não para mim.
Toda essa conversa sobre meus sentimentos já me estava tirando do sério, mais porque no fundo eu sabia que ele tinha razão, mas não podia admitir, seria como reconhecer toda a dor que tinha guardado, e reconhecê-la significa senti-la, e já tinha prometido a mim mesma de que iria evitar isso, engolir a seco, e enterrar o mais fundo possível, porque sofrer e chorar não faria nada mudar.
- Então o que quer que eu diga? O que esperava Joseph? Ver uma Catarina saltitante e feliz? Se me conhecesse bem como diz, sabe que seria o total inverso disso.
- Eu sei, só não esperava que estivesse guardando tanta raiva e dor com você.
- Todos têm suas cicatrizes tio, as minhas são só um pouco mais bem guardadas.
- Está enganada, você não as está escondendo, você as está alimentando Catarina, entenda enterrar a dor da a sensação de alivio por um período curto de tempo, mas um dia Catarina você tem que lidar com ela, porque se a fizer prisioneira, ela fará de você uma prisioneira dentro de si mesma, pensa que eu não vejo como você foge dos assuntos, desvia os olhos como para afugentar as lembranças, enrijece os punhos para evitar que a dor tome conta... Eu posso perceber isso tudo só te olhando agora Catarina, já passei por isso incontáveis vezes, sou muito mais velho do que pode imaginar, então acredite em mim quando digo que isso só irá aumentar seu sofrimento.
- Não se preocupe Joseph, não tenho tempo para lidar com sentimentos a muito enterrados, o tempo passou, a vida seguiu e tudo é diferente agora, o que eu sentia se foi junto com a Catarina que saiu da ordem a quase 2 anos, eu estou aqui apenas para lidar com essa doença, transformação eu não sei como chamam, com base nos fatos de que eu não vou sobreviver, logo concluo que não há com que me preocupar.
- Então é daí que tira forças pra manter essa fachada? É daí que tira forças para enterrar a dor dessa forma? Da desculpa de um alívio breve com a vinda da morte... Cuidado Catarina, as coisas nunca são como esperamos, elas sempre se modificam a sua vontade, então só tome cuidado para não mandar pra longe sua felicidade e depois se deparar com um vazio pior do que a morte.
- Joseph, tio...Eu, sinceramente? Estou cansada admito, mas não tenho outra alternativa, porque... Isso, essa dor que eu tenho dentro de mim, envia um nó pra minha garganta toda vez que eu me permito ao menos lembrar, então sim confesso que só não estou aterrorizada por essa transformação porque pela primeira vez depois de muito tempo eu poderei descansar.
- Oh minha querida – Ele se aproximou e me abraçou forte – Sinto lhe dizer que descanso é algo que você não terá por um bom tempo, infelizmente o que está por vir é complicado demais para que possa entender agora, mas me prometa que quando chegar a hora você vai se lembrar do que eu disse, e irá se permitir sofrer, se permitir chorar, e ir atrás da sua felicidade, irá lutar por ela e não deixará que nada de mal a possua.
- Como assim? O que está por vir? – Um arrepio percorreu o meu corpo, de certa forma quando perguntei a Joseph eu já sabia, alguma coisa estava errada e Joseph tinha razão, descanso era uma palavra que em breve eu não saberia o remoto significado.


 

Capítulo 3: Pisando em Pedras

Evanescence - Call Me When You're Sober

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Eu não posso viver essa vida
Sem você ao meu lado
Eu preciso de você para sobreviver

Então, fique comigo
Você olha nos meus olhos
E eu estou gritando por dentro
Que eu sinto muito
(Evanescence - Forgive me) 




Depois da discussão com a Clara eu me tranquei no meu quarto e passei a maior parte da tarde tentando tomar alguma decisão, colocar os pensamentos no lugar, ajeitar essa bagunça que estava a minha cabeça, mas todas as vezes que eu tentava achar uma solução que não incluísse partir, logo me vinha uma barreira como, médicos, a Cláudia, o que eu diria a ela, como minha irmã ficaria por me ver adoecer, e também porque eu estava com medo, eles haviam dito o que iria acontecer e eu não queria sentir essa dor, eu estava acabada só por esses desmaios, febres e dores de cabeça repentinas, imagine a verdadeira dor que ainda estava por vir, só de pensar em passar por isso sozinha de certa forma - porque a Clara não é vampira ela não entende de transformações, e eu muito menos - me assustava muito, eu confesso que queriam eles do meu lado, Isabella cuidando de mim, o Henrique com o seu jeito, durão e um pouco autoritário, mas ainda sim preocupado e atencioso, Hevi com suas palavras de otimismo, sempre dizendo como tudo iria ficar bem, e Joseph me fazendo rir, e me dando esperança como nenhuma outra pessoa, e eu nem queria pensar no último eu me recusava a me deixar ter noção da falta que ele me fazia, então aboli esse pensamento.
Eu precisava tomar uma decisão, eu não podia ficar aqui, mas voltar também não é tão simples, inclui muitas coisas, coisas com as quais eu tentei não lidar durante todo esse tempo, e já se passaram quase dois anos, e como será quando eu voltar? Obviamente não está tudo igual, quer dizer eles seguiram com a vida deles, assim como eu. DEUS! Era tanta coisa a se pensar, e eu me sentia cada dia mais exausta.
Clara bateu na porta.
- Cat? Me deixa entrar, eu quero conversar. por favor.
- Está bom - me levantei e abri a porta, ela passou por mim e se sentou na poltrona, eu voltei e deitei na cama, olhando para o teto.
- Pode falar
- Olha Cat, me desculpa ok? Eu sei o quanto você tem evitado esse assunto, o quanto tem tentado fugir disso, mas amiga... Eu não sabia o que fazer e Isabella disseram que se alguma coisa acontecesse era para eu ligar, e eu não tive outra opção, você está muito mal amiga, e eu não quero ver você assim, não se eu puder fazer alguma coisa, e eu posso então eu fiz, mesmo sabendo que ia te magoar, e eu me desculpo, mas não me arrependo.
- Está tudo bem, eu não to mais brava com você.
- Ai Cat - ela correu e me abraçou. - Amiga, por favor, vamos pra lá eu to com medo Cat eu não posso perder você, e eu sou egoísta o suficiente pra confessar que se você não aceitar eu vou levar você à força. - ela soltou um risinho, mas eu sabia que ela estava falando sério.
Eu suspirei. Eu estava tão exausta disso tudo.
- Quer saber? Chega, eu to cansada demais, e eu não quero mais lidar com isso sozinha, então se temos que ir pra Londres, nós vamos, vai doer, mas no final. - eu fiquei calada, o que eu iria dizer era "no final eu vou morrer de qualquer forma", mas achei melhor guardar essa parte pra mim, Clara já tinha coisa demais com que lidar por minha causa.
- Então você vai Cat?
- Vou, mas nós temos que ir amanhã? Não podemos, não sei, ir semana que vem, deixa eu me acostumar com a ideia. Eu não sei.
- Cat eu não vou esperar você piorar, nós vamos amanhã cedo.
Bufei isso era fácil, não fazia minha cabeça doer.
- Tudo bem então, eu vou dormir agora porque eu to com muito sono.
- Ta legal, dorme bem amiga e já sabe que é pra me chamar caso você se sinta mal, mas é pra chamar mesmo entendeu Catarina?
- Ta tudo bem, tchau Clara.
- Tchau - ela beijou minha testa e saiu do quarto.
O que se deve fazer quando o seu maior pesadelo e seu mais lindo sonho, estão juntos em um só? Eu tinha muito medo do que voltar poderia causar, eu guardei dor demais por todo esse tempo, e não queria senti-la agora, mas por outro lado voltar era tudo o que eu queria.

A manhã chegou, e com ela a decisão que eu tinha tomado. Suspirei.
Eu estava tão cansada de tudo ser tão complicado o tempo todo, ao menos uma vez eu queria que as coisas fossem simples, como elas eram quando eu saboreava a minha ignorância, e não sabia de nada sobre vampiros, bruxas e todas essas histórias, mas não se pode voltar no tempo, e mesmo se pudesse eu não voltaria simplesmente pensar em nunca os ter conhecido é impossível.
Desci pro café da manhã me sentindo bem melhor, o cansaço, a exaustão, a dor de cabeça tudo isso tinha ido embora, naquele momento eu me sentia como nos meses anteriores, totalmente normal e saudável, o que era irônico já que eu estaria embarcando para Londres essa manhã por estar doente.
- Bom dia Clara - ela me olhou de cima em baixo.
- Bom dia, pelo menos hoje você não parece um zumbi, isso é bom. - nós rimos juntas.
- É eu decidi abdicar de toda essa vida de "the walking dead" sabe, eu não sirvo pra ser atriz mesmo. - nós ficamos rindo por um bom tempo, até ficarmos sem ar e termos que parar pra recuperar o folego.
- Arrumou as malas?
- Já, e a que horas nós vamos?
- Daqui a pouco, depois que tomarmos o café.
- Ok, agora eu estava pensando, como é que nós vamos viajar pra outro país, sendo menores desacompanhadas, quando eu viajei com o Pedro, ele fez aquela coisa com o olhar na moça do checkin e nós passamos, e eu sinto dizer amiga você é sensual, mas acho que isso não vai funcionar.
- Você está subestimando a minha sensualidade ok? Mas isso não importa porque eu não vou precisar utilizá-la, eu tenho a identidade da minha mãe, e a caligrafia dela, sei fazer a assinatura dela mais perfeita do que ela mesma, então não se preocupe, minha "mãe" já fez um papel dizendo que está ciente que estamos viajando e que estamos autorizadas, e claro ela assinou.
- Clara Clara. Porque eu ainda perco o meu tempo de subestimar você? - eu ri Clara era um gênio do mal quando queria um gênio muito, muito esperto.
- Eu não sei querida, também me pergunto a mesma coisa.
Nós passamos o resto do café da manhã rindo, pela primeira vez em muito tempo o clima de tensão e cansaço que estava sempre no ar sumiu, acho que era porque depois de muito tempo eu estava de bom humor, isso claro tirando o meu estado de ansiedade e terror por dentro, mas eu estava reprimindo isso, como eu disse, aprendi perfeitamente como reprimir coisas ruins, e estava me saindo muito bem nisso.
Depois que arrumamos as malas, fomos direto para o aeroporto, a fila do checkin estava um inferno, depois de algum tempo enfim chegou nossa vez, a moça do checkin pegou a identidade de Cláudia, analisou a assinatura e nos deixou passar sem nenhum problema. Clara era realmente um gênio do mal - eu ri comigo mesma.
Nosso voô atrasou umas boas duas horas, e quanto mais o tempo passava mais a ansiedade que eu estava reprimindo lutava para sair, por mais que eu tentasse fingir que estava viajando pra outro lugar, como Caribe com aquelas ilhas lindo, onde não teria nenhum vampiro, e muito menos nenhum quase namorado vampiro também, isso não estava ajudando muito, então comecei a ler um livro que eu tinha trago, pelo menos assim eu pensaria na história e nos problemas de outra pessoa e não nos meus, no fim a protagonista iria se dar bem mesmo, então menos mal.
Quando embarcamos no avião eu me forcei a dormir, se eu ficasse acordada eu iria entrar em pânico, então pedi um comprimido pra dor para aeromoça, e peguei no sono minutos depois. Clara me acordou dizendo que já iríamos pousar, e eu desejei ficar naquele avião pra sempre, morar ali, seria mais fácil do que descer e encarar tudo de novo.
Meu coração batia como se eu acabasse de correr uns dois quilômetros e a adrenalina ainda corresse pelo meu corpo, quando saímos e vimos a Hevi em pé nos esperando eu confesso que um alívio tomou conta do meu corpo, como era bom vê-la, eu estava reprimindo tanto isso que nem me dei conta do quanto sentia a falta dela.
Ela me abraçou apertado.
- Oh Catarina, como é bom te ver, eu senti tanto a sua falta. - ela me soltou e ficou me olhando.
- Ah eu também Hevi, nem me fale... Como você está? - eu sorri
- Ok. Vamos parar de melação, e vamos partir para parte onde você me abraça e diz que sentiu minha falta também ok? - Hevi agarrou a Clara, e elas ficaram rodando e dizendo o quanto sentiram falta uma da outra, e a Hevi dizendo que a ordem perdeu a graça sem o humor da Clara.
- Eu só sou realista, só isso. - nós todas rimos juntas.
- Então vamos? Vocês precisam me contar tudo, o que fizeram como estão, quais as novidades.. Quero saber de tudo!
Nós entramos no carro, e fomos conversando.. Contamos tudo para ela, das notas, do colégio, das pessoas, do curso, da Aline e da Cláudia, mas como se o aviso estivesse no ar, não tocamos no assunto que me trouxe aqui, e era melhor assim eu não queria lidar com isso agora.
Quando o carro virou e passou pelo portão, a primeira coisa que eu quis fazer foi chorar, eu vi de novo a mansão e me lembrei da primeira vez que eu vim aqui, e quem estava comigo, eu estava com tanto medo e o fiz prometer que não sairia do meu lado, eu ainda me lembro de como fiquei boquiaberta com a beleza do lugar, o tamanho, o jardim, tudo, e claro o carvalho, eu só pude vê-lo de longe porque estava dentro do carro, mas naquele momento uma coisa em mim se aliviou, como se tirasse um peso enorme das costas, um peso grande demais.
Eu acho que é assim com o calor, ele queima porque precisa do frio, os dois juntos completam um ao outro, como um equilíbrio, e quando estão equilibrados, o alívio vem.
Isso estava acontecendo comigo, eu estava queimando a muito tempo, porque precisava disso, dessa vida, dessas pessoas, elas me completavam, equilibravam a minha vida por mais estranha que fosse, e agora que eu voltei depois de muito tempo eu pude me sentir verdadeiramente em paz, ou quase.