quarta-feira, 11 de abril de 2012

Capítulo 2: Acampamento de verão

Evanescence - Everybody`s Fool

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Sem a máscara
Onde você vai se esconder?
Não consegue se encontrar, perdida em sua mentira
(Everybody’s fool – Evanescence) 


Depois daquela noite eu melhorei as dores de cabeça ainda eram frequentes, mas essas eu conseguia aguentar, não eram tão fortes como aquela, e os desmaios pararam, eu só ficava tonta às vezes, ou minha vista escurecia, mas eu disfarçava e logo voltava ao normal, eu consegui adiar a visita ao médico ficando rapidamente curada, ou pelo menos foi isso que eu fiz a Cláudia pensar, no dia seguinte do desmaio eu estava exausta, mas ainda sim eu me maquiei - o que eu nunca fazia pra ir para escola - me arrumei, e desci toda animada, no café as duas me olharam desconfiadas, mas não disseram nada, e eu continuei assim pelo resto do dia, mesmo querendo me deitar e dormir, eu sorria, contava uma piada, ou fazia planos pro final de semana, depois de dois dias eu disse despreocupadamente para Cláudia que eu tinha um trabalho muito importante na sexta e que não poderia faltar, e que de toda maneira eu já estava melhor, devido a toda a minha animação ela deixou passar, mas a semana continuou, o cansaço era cada vez pior, e todas as manhãs eu comecei a perceber o que a Clara disse sobre eu parecer um zumbi, eu acordava sempre suando frio, e extremamente pálida, com as olheiras saltando do meu rosto, e com isso se criou uma nova rotina, me maquiar, tampar as olheiras, deixar meu rosto rosado, tomar uma ducha fria pra despertar o meu corpo, e era assim todas as manhãs, eu criava uma máscara e fingia que estava bem, é claro que uma vez ou outra eu me desequilibrava ou fazia uma careta por causa da dor de cabeça sem querer, mas ai eu dizia que era só eu sendo a estabanada de sempre, ou que eu estava com dor de cabeça por ter ouvido música alta a noite inteira.
De manhã eu fiquei sabendo da viagem, Cláudia tinha inscrito Aline em um acampamento de verão, como Aline sempre quis ir a um, e de repente panfletos misteriosos começaram a surgir pela casa, Cláudia decidiu que a levaria, a criança precisava de um acompanhante para ir ao acampamento e Cláudia iria com ela, já que nós não tínhamos idade. E eu odeio florestas, não me sinto bem, elas me deixam desconfortável, eu acho.
Faltando alguns dias para a viagem, Cláudia começou a arrumar as coisas, fazendo comida de sobra, arrumando a casa, deixando as malas prontas, o acampamento era em algum lugar do interior de Minas Gerais, com cachoeiras, lagos, enfim maravilhoso, elas iriam ficar por um mês, ou um mês e meio se eu não me engano, as aulas da Aline iriam voltar só daqui a dois meses - santo colégio, que sorte - e Cláudia tinha pedido licença no trabalho de um mês e meio pra poder levá-la, assim elas ficariam fora bastante tempo, na noite que ela disse isso eu me lembro de rir bastante com seu sermão para Clara.
 - Nada de festas, nada de frases que incluam as palavras garoto, casa, quarto, ou qualquer outra parte da casa, eu sei que se pode fazer muito mais em qualquer outro lugar, você entendeu Clara? E se lembre do que eu sempre digo, quando você pensa que eu não estou vendo, é exatamente ai que eu estou te observando mais do que nunca, mesmo não estando aqui, então não me decepcione - Ela arqueou uma sobrancelha para Clara, esperando uma resposta.
- Pelo amor de deus mãe, nós não precisamos saber sobre as suas experiências sexuais ok? Guarde as lindas e românticas memórias pra você, eu to bem assim é sério. - eu não aguentei e tive que rir - E sim eu entendi, nenhum ser vivo do sexo oposto, a não ser que não seja da mesma espécie, como um cachorro ou um peixe, está anotado Dona Cláudia.
- Eu acho bom, eu vou ficar de olho em você.
- Ta bom mãe pode parar agora, essa coisa de filme de suspense de "eu vejo vocês" ta muito piegas a gente já entendeu, está vendo é isso que da ficar vendo "eu sei o que vocês fizeram no verão passado", as férias nem começaram e a mulher já está tendo profecias.
- Eu sou sua mãe Clara Martins e eu te conheço melhor do que ninguém, e eu sei o que se passa na sua cabecinha, então.. Não, não pense, não faça!
- Eu.já.entendi! - Clara falou lentamente como se falasse com alguém que sofre de problemas mentais.
- Bom se é assim, estamos conversadas, e você senhorita Catarina, se passar mal me ligue imediatamente entendeu? Só porque você não gosta de médicos isso não significa que eles são desnecessários, e as mesmas regras de Clara, valem para você também, por favor, meninas eu não quero surpresas quando eu voltar.
- Pode deixar Cláudia, pode ir tranquila.
- Agora comam, o café de vocês vai esfriar, e vocês vão se atrasar.

Tivemos mais uma semana de aula, então a Cláudia foi viajar, aproveitei os primeiros dias em casa pra estudar, eu precisava estar preparada para quando os exames chegassem, eu tinha que tirar uma nota muito alta caso quisesse entrar pra uma boa universidade, e isso pelo menos me distraia, me fazia esquecer de dores, desmaios e todos os sintomas estranhos que eu vinha sentindo.
Clara tentou me animar, nós fomos à praia, ao shopping, até ao teatro, mas isso é claro porque eu a obriguei, Clara é imperativa demais para ficar prestando atenção a algo por mais de uma hora.
Mas como se uma praga as minhas preces, os sintomas voltaram e dessa vez eles ficaram piores, primeiro a febre aumentou, eu acordava no meio da noite, com os lençóis molhados e toda encharcada de suor, eu já tinha perdido uns bons 10 quilos, mas o físico eu ainda conseguia esconder, quer dizer eu estava normalmente magra, mesmo perdendo esses quilos, e sempre existia a bela e abençoada maquiagem para o problema com a palidez e as olheiras, o que estava me preocupando eram as pontadas repentinas que eu tinha na cabeça, essas pontadas eram a pior dor que eu já tinha sentido na minha vida, a primeira vez que elas vieram eu estava no banho e no mesmo instante eu cai e me agachei de dor, mas elas pelo menos não eram duradouras, eram pontadas rápidas, mas deixavam minha cabeça latejando por um tempo, o meu único medo é que elas viessem quando eu estivesse na presença de alguém, tudo o que eu menos queria agora era estragar a viagem da minha irmã. E elas vieram, uma tarde quando eu estava me arrumando para ir ao shopping com a Clara para ela comprar um sapato - depois de ela ficar falando a manhã inteira na minha cabeça, sobre como ele era perfeito, e sobre como foi destino ela tê-lo encontrado - eu estava pronta e desci as escadas, a Clara estava em pé na sala me esperando e antes que eu chegasse ao último degrau ela veio uma das mais fortes, eu não aguentei me agachei no mesmo momento e acabei tropeçando e rolando pela escada, caindo no chão e batendo a cabeça. Clara correu na minha direção gritando o meu nome, mas minha cabeça latejava, e eu tinha batido com ela forte demais, eu não conseguia entender muita coisa.
- A meu deus Catarina! Você está bem? Deus! Eu vou ligar para minha mãe.
Eu agarrei o braço dela
- Não, eu-eu to bem, por favor, não liga pra ela.
- Tudo bem, mas eu não posso ficar sem fazer nada Catarina, isso tem que parar, chega eu não posso mais ver você se esforçar tanto, e se acabar sozinha amiga, eu sei quem pode te ajudar, e você vai me odiar, mas pelo menos vai me odiar saudável, ou melhor, do que está agora.
 Depois de me deitar no sofá, ela subiu as escadas e sumiu por longos minutos, eu adormeci e acordei com o barulho dos seus passos.
- Aonde você foi? Você não ligou pra sua mãe né? Diz que você não ligou pra ela.
- Eu liguei, mas não pra falar o que você pensa.
- O que? O que você disse?
- Disse que nós vamos a sua casa do Lago, que você está com saudades e que você quer aproveitar essas férias para passar lá.
- Porque você disse isso? Nós não vamos para o Lago.
- Eu sei que não.
- Então, por quê?
- Nós vamos para Londres - ela fez uma pausa observando enquanto minha expressão ia de confusão a fúria.
- Não, "nós" não vamos a lugar algum - eu disse de modo ríspido, dando ênfase no "nós".
- Sim nós vamos, e você não tem direito de escolha, você está doente.
- Clara você está maluca? Nós não podemos simplesmente aparecer lá do nada, você é louca?
- Eu sei que não, a Hevi estará nos esperando amanhã à tarde no aeroporto.
- O que?! - eu explodi, eu fiquei de pé, cambaleante.
- Você quer gritar? Pelo amor de deus Catarina, você nem ao menos consegue ficar de pé, tenha um pouco de amor próprio, ou se não pela sua irmã, você quer que ela veja você se acabar? Cada vez mais doente, e mais doente? O que? Até você ficar de cama, e minha mãe te levar ao hospital, e ai o que Catarina? Que doença você acha que eles vão diagnosticar? Nenhuma Catarina por que você estava certa desde o início, você não está doente, como uma virose, ou algo do tipo, você está doente porque está se transformando, e sinto dizer, mas não está indo muito bem, então uma vez na vida para de ser teimosa, e faça o que você sabe que é o melhor, porque você querendo ou não Catarina, eu não vou assistir você morrer! - Clara gritou na última frase, e eu pude ver que também não era fácil pra ela, pude ver a dor e o medo de me perder, os mesmos que eu sentiria se fosse ela no meu lugar. Mas que diabos! Porque tudo em relação a minha vida tinha que ser tão complicado.
Eu não disse nada, subi para o meu quarto e deitei, eu precisava descansar, eu sentia que ia cair a qualquer minuto.
E principalmente eu precisava pensar, havia muita coisa em jogo, eu deixei muita coisa pra trás, eu enterrei coisas demais na parte mais funda de mim, para agora desenterrá-las e eu não sei se posso, porque eu não sei como elas virão a superfície, não sei se eu posso aguentar. E tinha minha irmã, quer dizer e se eu não voltasse? E não pudesse me despedir, seria melhor ou pior pra ela que eu partisse longe? Eram tantas perguntas, e eu não tinha uma sequer resposta, eu só não podia mais ficar do jeito que eu estava, caindo pelos cantos, tentando esconder uma coisa que me consumia cada dia mais por dentro, eu não tinha mais forças.
Era hora de voltar, e eu parti pensando que nunca diria isso.
O destino da muitas voltas, e o ruim de você voltar pela mesma rua em que veio, é que mesmo sabendo onde estão os espinhos, você não pode desviar deles.




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